Os Oito Odiados -Crítica

Verdade seja dita , Tarantino tem um público alvo , se você não gostou de Bastardos Inglórios , Kill Bill e Pulp Fiction provavelmente não vá gostar de Os Oito Odiados , oitavo filme do cultuado diretor que se diverte a beça  em deixar a plateia desconfortável em suas 3 horas e 7 minutos de duração , que contém todos os elementos que o tornaram famoso , humor negro , violência caricata e exagerada, quebra na linha temporal , divisão em capítulos, monólogos e inúmeras cenas verborrágicas . Tenho que admitir que no meio do segundo ato eu já estava um pouco cansado de como o desenrolar da trama estava lento(tinha um sujeito dormindo na cadeira ao lado) , mas a lentidão das coisas é algo fundamental para o desenvolvimento não só dos personagens mas da própria atmosfera de tensão e angustia que é criada durante o tempo de projeção, Os Oito Odiados é o filme mais longo de Tarantino , mas isso não é um defeito.

A história se passa 6 anos após o fim da guerra civil , acompanhamos um diligencia
que atravessa as regiões montanhosas e repletas de neve de Wyoming que leva o caçador de recompensas John ''o carrasco'' Ruth(Kurt Russell) e sua prisioneira Daisy Domergue (Jennifer Jason Leigh) que será enforcada em Red Rock. Mas no caminho eles acabam dando carona para dois sujeitos meio suspeitos , o Major Warren Marquis( Samuel L. Jackson) e o recém xerife Chris Mannix , porem , devido a intensidade da tempestade o grupo tem que fazer uma pausa e acabam no armazém da Minnie , a situação evolui já que o lugar tem mais alguns estranhos que podem colocar em risco a recompensa de John Ruth .Os Oito Odiados é um Tarantino à moda antiga , com longos diálogos que sem pressa vão construindo um atmosfera sufocante de paranoia , algo que é reforçado devido a incessante nevasca que castiga o precário armazém ,pegando emprestado elementos do filme O Enigma do Outro Mundo sobre a constante ameaça de não saber quem está falando a verdade ou quem está mentindo , algo que o diretor já havia explorado de maneira mais tranquila no excelente Cães de Aluguel , já que o filme se passa em apenas um ambiente , e é justamente a graça de saber como esse impasse será resolvido em que reside o ponto forte do filme , já que realmente não sabemos como isso vai terminar , apenas sabemos que será de uma maneira nada amigável .

Tarantino não tem medo de se soltar , a violência continua presente e como sempre divertida de se assistir ,só que dessa vez em doses menores se comparado com Django Livre, o humor negro é explorado com sabedoria pelo diretor , nada de cenas escatológicas , não é como assistir a um episódio da serie Jogos Mortais , claro que tem um banho de sangue , entretanto , reclamar de fatores assim seria criticar Tarantino por fazer algo que se tornou sua assinatura , seria impedi-lo de se diferenciar dos demais diretores que temos por aí. Engana -se quem acha que seu estilo seja usado de maneira gratuita , debaixo de seus personagens sujos de sangue está um poderoso discurso sobre a evolução da sociedade em querer resolver situações com violência , e também , porque não , falar de novo sobre racismo , já que estamos em pleno 2016 e direto vemos casos de atores negros sendo atacados na redes sociais com ofensas ou até jogadores de futebol sendo chamados de ''macacos''. Enfim , cada um dos personagens representa os preconceitos e a ignorância do mundo em que vivemos , mexicanos , negros , mulheres , minorias ou não que são oprimidas pelo homem branco , e Tarantino filma tudo de perto, com o máximo possível de detalhes que a sua Panavision 70mm pode captar , contrariando o seu propósito , sendo que na época em que foi criada , a câmera era utilizada para filmar historias épicas , não que Tarantino faça mal uso desse recurso , temos sim tomadas das belas planícies cobertas de neve em Wyoming , mas aqui  as lentes são usadas como recurso narrativo para ajudar a compreender melhor as figuras que vamos conhecer durante a projeção .

Com um domínio de técnica e narrativa invejáveis , Tarantino também é um excelente diretor de atores , mesmo contando com atores medianos , tirando o trio Samuel L. Jackson ,  Kurt Russel E Jennifer Jason Leigh (Esqueci do veterano Bruce Dern) que já haviam mostrado suas habilidades anteriormente , e com certeza um quem ganha destaque é Walton Goggins devido seu timing cômico ao encarnar Mannix como um sujeito que gradativamente vai mudando seu comportamento. E mesmo passando boa parte do filme levando socos no rosto , Leigh é o diabo em pessoa usando de todos os artifícios para infernizar a vida de Russel e Jackson , e mais uma vez Tarantino mostra que entende muito bem das ferramentas de roteiro ao apresenta-la sendo humilhada e espancada por Russell , um elemento que serve para humanizar a personagem , só para depois o diretor subverter a expectativa .

Ate o figurino é utilizado para marcar quem é uma ameaça em potencial , aqui simbolizado pelas cores amarelo (alerta) e vermelho(perigo) , como na cena em que o personagem Joe Gage(Michael Madsen) é desarmado , ele troca o seu lenço vermelho por um lenço amarelo.Ou no personagem de Jackson que possui detalhes amarelos em seu sobretudo , com uma gravata vermelha.E como é bom saber que dessa vez Tarantino deu espaço para Ennio Morricone compor músicas para a trilha do filme , Morricone sempre falou em entrevistas sobre como não gostava de trabalhar com Quentin , sendo que ele apenas revisitava os temas de filmes anteriores .O trabalho do veterano compositor se adequa perfeitamente ao filme , não é tão marcante quanto em Era Uma Vez no Oeste , mesmo assim é muito bom ver que alguém com 87 anos consegue compor músicas de maneira tão eficiente , uma lenda viva.

No final das contas Os Oito Odiados não é filme acessível como Django Livre , porem ,não deixar de ser uma homenagem apaixonada pela sétima arte , Tarantino faz filmes situados no universo do cinema , por mais que seus maneirismos acabem nos lembrando de que aquilo é apenas ficção , tudo tem um propósito , resta o publico aceitar se vai embarcar na viagem do diretor ou não , mas ele garante que será uma passeio inesquecível que só ira melhorar a cada nova visita .

Os Oito Odiados 5/5 Estrelas